19 de agosto de 2018, Jornal Hoje em Dia – 

Não importa se você é pai ou mãe de primeira viagem ou se já tem muitos filhos. Dúvidas sobre estar seguindo o caminho correto na educação e formação de uma criança são comuns a qualquer família. Contrária a um manual de conduta e a receitas de certo e errado, uma filosofia vem despertando a atenção ao propor o caminho do meio entre permissividade e autoritarismo, baseando-se, principalmente, em firmeza e gentileza.

Imagem-destaque: MENOS REGRA, MAIS AMOR – Laura e o marido, Andrey, modificaram o olhar sobre a educação dos filhos, Duda e Benício: “Vi que é possível adquirir respeito por meio do amor e do respeito à vontade deles”

Certificada pela Positive Discipline Association e referência no assunto em Belo Horizonte, com mais de 38 mil seguidores no Instagram, a educadora parental em disciplina positiva Mariana Lacerda diz que o método individualiza o tratamento com foco na solução e não no problema.

O ponto de partida é transformar cada desafio (como são denominados comportamentos considerados ruins) em oportunidade de ensinamento e aprendizado emocional.

“Não é uma abordagem com fórmula mágica, que vai fazer com que todas as crianças se tornem obedientes, submissas e não se comportem de maneira desafiadora novamente. Mas modifica nosso olhar para o desafio. A mudança começa no adulto”, ressalta Mariana, que é terapeuta ocupacional, doutoranda em saúde da criança e do adolescente.

A especialista orienta sobre como agir, por exemplo, diante de uma birra motivada por frustração. “Muitos métodos ensinam a ignorar a criança ou bater para que ela não repita aquela conduta. Em ambos os casos, o objetivo é simplesmente parar o comportamento. A disciplina positiva diz o contrário. Mostra que aquele é o momento ideal para ensiná-la sobre como agir diante daquela emoção”, exemplifica.

TREINAMENTO
Especialista em disciplina positiva, Mariana Lacerda reforça que ferramenta deve ser aprendida na prática

Exercicío da escuta

Mãe de Maria Eduarda, de 3 anos, e de Benício, de 1 ano e 4 meses, a servidora pública Laura Pires da Cunha, de 36, procurou a disciplina positiva assim que a primogênita completou 2 anos. Aprendeu a substituir a rigidez extrema, os gritos e frases como “eu sou adulta e sei o que é melhor para você” pelo exercício da escuta e do respeito à vontade do outro.

Hoje, tem uma relação menos hierárquica e mais amorosa com os filhos. “Comecei a ver que existe outra forma de conquistar respeito, que é através do amor e da escuta, pois eles são seres humanos que têm vontades e precisam ser respeitados. Uma das coisas mais importantes é enxergar a necessidade por trás de cada comportamento e não simplesmente bani-lo”, afirma.

Mãe de Maria, de 3 anos, Ana Paula Rodrigues Sanches, de 40, trilhou caminho semelhante ao lidar com a menina que, aos 6 meses, deixou de reagir bem ao cantinho do pensamento (castigo que força a criança a refletir sobre um comportamento inadequado).

“Passei a levar em consideração os sentimentos e opiniões dela e a escolher que batalhas travar. Não me importo, por exemplo, que ela pule no sofá, mas não abro mão das horas de dormir e comer. Assim, ao invés de impor, escuto e converso e ela, dessa forma, se sente mais amada e respeitada”, explica a servidora pública.

Longo prazo

A educadora parental em disciplina positiva Mariana Lacerda diz que os benefícios da filosofia na educação dos filhos têm efeitos também a longo prazo. “A grande questão é que muitos pais querem ensinar só a não se comportar daquela forma naquele momento, mas não querem solucionar o motivo que levou àquela atitude. A disciplina positiva é mais que um método educacional, é uma ferramenta de aprendizado”, reforça.

QUESTÃO DE ESCOLHA
Ana Paula aprendeu a escolher que batalhas deseja travar com a filha Maria: “Não me importo que ela pule no sofá, mas não abro mão da hora de comer e dormir”

Ser gentil e firme muda qualquer relacionamento

Pioneira em disciplina positiva no Brasil e em Portugal e treinadora líder certificada, Fernanda Lee ressalta que a ferramenta pode ser usada não só com crianças e adolescentes, mas em todos os relacionamentos. O ponto-chave, conforme a especialista, que trabalha com a dra. Jane Nelsen – precursora da filosofia no mundo –, é a compreensão do sentimento do outro.

“Uma pessoa só irá conseguir escutar o que precisa se estiver se sentindo ouvida. O sentimento de compreensão é fundamental e a disciplina – que sempre foi usada como uma palavra pejorativa – só vai ser realmente efetiva se usada dessa forma. Firmeza e gentileza cabem em qualquer contexto, entre pai e filho, casais e parceiros”, reforça a co-fundadora do site disciplinapositiva.com.br.

Mudança de visão

Fernanda Lee associa a popularidade da disciplina positiva a uma mudança na história das gerações (os millennials) mais questionadoras e resistentes. “As crianças, agora, observam a dinâmica que vivem em casa. Para criar um adulto diferente, portanto, eu preciso ser diferente. Como criar consciência crítica se não as deixamos opinar? Todas têm direito a respeito e dignidade e esse não é um trabalho para ser feito sozinho, mas em comunidade”, afirma.

Segundo a dra. Jane Nelsen, qualquer criança pode aprender cooperação e autodisciplina sem ter a autoestima e a dignidade prejudicadas.

Além disso:

Desenvolvido pela dra. Jane Nelsen, a disciplina positiva é um programa baseado no trabalho do psicólogo Alfred Adler e do psiquiatra e educador Rudolf Dreikurs, ambos austríacos. O objetivo do método, difundido no Brasil recentemente, é encorajar crianças e adolescentes a se tornarem responsáveis, respeitosos, resilientes e aptos a solucionarem os próprios problemas ao longo da vida. A filosofia se baseia em cinco princípios e aponta mais de 50 ferramentas para ajudar os adultos a desenvolverem as habilidades que desejam para as crianças.

Cinco princípios da disciplina positiva:

  1. Ajudar a criança a se sentir conectada: sentir que é aceita na família e/ou na escola e que é capaz de contribuir
  2. Encorajar o respeito mútuo: agir com firmeza e gentileza ao mesmo tempo. Os adultos tornam-se o modelo de respeito que desejam ter
  3. Ser eficaz a longo prazo: considerar o que a criança está pensando, sentindo, aprendendo e decidindo sobre si mesma e sobre o meio social
  4. Ensinar habilidades sociais e de vida: respeito, cuidado com os outros, resolução de problemas e cooperação
  5. Incentivar a descobrir as próprias capacidades: encorajar o uso construtivo do poder pessoal e o desenvolvimento da autonomia

Saiba mais sobre a história da disciplina positiva clicando aqui.

Informações sobre cursos e workshops:

Veja alguns desafios colocados pelas crianças e sugestões de comportamento para os pais, conforme a disciplina positiva: